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quinta-feira, 31 de julho de 2014

Parte 1 do conto Terra II

O céu está limpo, com algumas nuvens esparsas se formando no horizonte. O vento perto da lagoa é suave e agradável. As aves nadam, caçam e voam tranquilamente de uma ponta a outra dela. Daquele ângulo, a paisagem é exuberante. Abel nem consegue acreditar em tantas fotos boas que está conseguindo tirar naquele dia. As aves parecem estar posando para as câmeras, tão à vontade estão com a presença dos três.
ABEL: – Olha aquelas garças. Ficam totalmente paradas por um bom tempo esperando o peixe. E, de repente... zum!
Numa bicada certeira, uma das garças pega um peixe e voa para o outro lado da lagoa.
CEL: – Legal! Cliquei bem na hora.
Abel solta um suspiro aliviado, feliz por sua ansiedade não ter se transformado em enxaqueca justo naquele dia.
ABEL: – Que bom que finalmente deu certo para a gente vir. Há tempos quero vir aqui, mas não encontro oportunidade nem companhia. Nem consegui dormir direito à noite por causa disso. Odeio quando isso acontece.
CEL: – Relaxa, Abel. Não seja tão perfeccionista.
ABEL: – É que metade da turma não pôde vir. Aí eu achei que nada daria certo.
PEDRO: – Acho que eles já terão diversão suficiente por hoje.
CEL: – Eles também teriam se tivessem vindo. Quem sabe na próxima.
Desde que conhecera Cel, Abel a achava tão agradável que lamentava não tê-la conhecido antes. “É assim mesmo, é assim que tem que ser” é o que ele sempre diz a si mesmo. Os três estudam na mesma sala do último ano do ensino fundamental. Cel havia sido transferida para a escola deles algumas semanas após as aulas terem começado. Essa é a primeira vez que Pedro passarinha.
De repente, a brisa agradavelmente quente se torna um forte vento gelado. Eles estão tão concentrados no que estão fazendo, que nem percebem o que está acontecendo ao redor.
ABEL: – Estranho. Ficou tão escuro de repente.
PEDRO: – É melhor vocês darem uma olhada naquilo. *aponta com o olhar*
CEL: – Ah, não! Chuva?
ABEL: – Mas como é possível? A previsão do tempo dizia que-
PEDRO: – O tempo é algo imprevisível. Não há nenhuma certeza do que ainda vai acontecer.
As aves começam a voar para longe dali, quando, repentinamente, pesadas gotas de chuva começam a despencar sobre eles, como se tivessem se distraído do que estavam fazendo e lembrado da gravidade.
CEL: – Uma caverna! *aponta* Vamos para lá! Rápido.
PEDRO: – Só espero que não tenha nenhum bicho assustador dentro, como um urso.
ABEL (parando): – Urso!? *se assusta, pensa e volta a correr* Espera aí – nós estamos no Brasil! Aqui não tem mais nem onça, como é que tem urso!?
PEDRO (gargalhando): – Não acredito que você caiu nessa!
ABEL: – Ora, seu...
Um trovão ecoa ali perto, bem no instante que eles alcançam a caverna.
CEL (ofegante): – Pelo menos *respira* aqui dentro não tem goteiras.
ABEL: – Por que tinha que chover logo hoje? Eu devia ter imaginado que algo assim aconteceria. Eu sinto muito, pessoal. Eu sou só um tolo na colina.[1] Eu não sabia q-
CEL (olhando-o fixamente): – Deixa disso, Abel. Relaxa. Está tudo bem. O dia foi ótimo até agora. Não foi, Pedro?
PEDRO: – Tanto faz.
CEL (incrédula): – Pedro! Ninguém tinha como saber da chuva, Abel. E só vai ficar ruim se ficarmos parados. Vamos aproveitar a oportunidade e explorar essa caverna, deixar o tempo passar. Quem sabe a gente não encontra pinturas nessas paredes, ou algo assim.
ABEL: – E se tiver mesmo algum bicho?... Ou algo assim?
CEL: – E se não houver? Quem sabe há uma bela fonte... ou algo assim?
ABEL: – Mas...
CEL: – A gente precisa enfrentar nossos temores, Abel. Nossa fé tem de ser maior que nossos medos. Vamos.
Cel vai adentrando a caverna, seguida por Pedro. Abel olha para fora da caverna e vê a chuva ficando cada vez mais intensa, até um relâmpago iluminar o céu, seguido de um estrondoso trovão. Uma lufada de vento molha Abel, mas ele apenas fica parado, inerte. Frustrado pelo que se tornou seu dia, Abel vai atrás dos outros, seguindo desanimado a trilha d’água que se forma no chão da caverna.
ABEL (cantando baixinho): – “Eu rabisco o sol que a chuva apagou...”
Ainda há alguma claridade, mas eles usam suas lanternas. Abel teme apontar a sua para o teto e morcegos voarem pela sua cabeça, então ele vai silenciosamente atrás dos outros apontando sua lanterna para as paredes. Após alguns minutos em silêncio, ele dá um suspiro e uma sugestão.
ABEL: – Pessoal, acho que já fomos muito longe. Talvez a chuva já esteja diminuindo e-
PEDRO: – Sua mochila está pesando, né? Também, quer trazer o quarto inteiro nela.
ABEL: – Não é isso! Eu só espero que as baterias durem até a volta e-
CEL: – Esperem. Olhem aquilo ali!
Pedro aponta sua lanterna para onde a de Cel está apontando e Abel faz o mesmo. É como uma bolha flutuante de mais ou menos um metro quadrado, flutuando à quase dois metros do chão, próximo a eles, que distorce e desvia a luz como um prisma.
PEDRO: – Que coisa estranha.
CEL: – O que será que é?
Cel vai se aproximando da bolha, fascinada, iluminando a área ao redor.
ABEL: – Cel, cuidado!
De repente, ela começa a ser atraída para perto da bolha.
CEL: – Ei, o que está acontecendo?
ABEL (horrorizado): – Pedro, segura ela!
Após a ordem de Abel, Pedro solta sua lanterna e agarra a alça da bolsa azul de Cel quando ela começa a flutuar do chão e a ser sugada pela bolha. Tudo acontece tão rápido que Abel não tem tempo de planejar o que fazer. Então ele simplesmente agarra a mochila de Pedro e começa a puxar também quando vê que Pedro também está sendo atraído e elevado, como se a gravidade agora tivesse esquecido a existência deles. Cel tenta resistir, mas a atração da bolha é mais forte, e logo Cel é tragada totalmente por ela.
ABEL: – Não solta ela, Pedro! Continua puxando!
Pedro não a solta, mas logo desaparece também, deixando Abel arrastar seus pés no chão em busca de alguma resistência. Mas toda resistência é inútil e logo ele também é sugado de uma vez para dentro da bolha.
Logo em seguida, a bolha também diminui até desaparecer de vez.


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Angel Lyla